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Os Descendentes




          Alexander Payne (Eleição, As Confissões de Schmidt, Sideways - Entre Umas e Outras), como um típico diretor-autor escreve e dirige seus próprios filmes. Mais que roteirista e diretor, Payne é indiscutivelmente um humanista. Os erros e indecisões de suas personagens são sempre vistas com compaixão. Payne parece dizer que errar é humano, e que não há heróis, nem vilões, nem muito menos vítimas. Somos apenas homens. Imperfeitos por natureza. Um defeito de fabricação, por assim dizer. Os Descendentes (The Descendants, 2011) é até hoje seu filme de maior sucesso de crítica e bilheteria nos Estados Unidos. O nome de George Clooney como ator principal ajudou bastante, é claro. Clooney não é apenas o ator ou personagem principal da trama. Ele praticamente carrega o filme nas costas, de uma maneira que nunca experimentou antes.  E longe do estereótipo de solteirão cobiçado. Sua personagem é um homem maduro, prestes a se tornar viúvo, que terá que finalmente assumir a criação das filhas que na verdade nem conhece direito. É impagável a cena em que tenta se aconselhar com o amigo da filha mais velha.


          Dirigido com competência e mão leve, a história de Os Descendentes poderia facilmente descambar para o piegas e melodramático. Não há defeitos em sua narrativa, embora uma única cena não tenha me agradado, particularmente (não posso citá-la, pra não ser um spoiler - revelando o filme pra quem ainda não o viu). Payne é excelente diretor de atores, mas ainda fica apenas acima da média, sem grandes voos,  limitado a executar bem o seu ofício. Para a crítica americana, com Os Descendentes , Payne já "chegou lá". Algo que vi acontecer com seus contemporâneos Jason Reitman (com Amor Sem Escalas - Up in the Air) e Paul Thomas Anderson (com Sangue Negro). Pessoalmente, ainda espero mais dele.

Música para os Olhos

                         


          Desde os anos ´60, é tradição que qualquer cantor, banda ou compositor pop de sucesso acabe tendo suas canções aproveitadas pelo cinema. Há filmes cuja trilha sonora inteira é composta de canções pop, algumas feitas especialmente para o filme, mas na sua maioria pré-existentes. O que era raro, mas tem se tornado cada vez mais comum é músicos de sucesso se aventurarem a compor trilhas (e não canções) para filmes. O que pode ser eventual na carreira de muitos, dependendo do sucesso da empreitada, pode se tornar habitual. A mais nova incursão veio pelas mãos de Trent Reznor (da banda hard-rock Nine Inch Nails). Em parceria com seu produtor, Atticus Ross, a dupla colecionou prêmios (inclusive o Oscar) para a trilha do filme A Rede Social. Parece que a dupla pegou o gosto, porque voltaram a colaborar com o diretor David Fincher, para seu último filme - o remake americano de Os Homens que Não Amavam as Mulheres (The Girl with the Dragon Tattoo). Já vimos nos últimos anos, além de Reznor, o Chemical Brothers compor para um filme (Hannah); Johnny Greenwood, do RadioHead (para Sangue Negro) e  Eddie Vedder, do Pearl Jam - para Na Natureza Selvagem. O que, às vezes, acontece, é o artista demonstrar mais talento para compor trilhas sonoras, chegando a abandonar sua não tão exitosa carreira pop. Exemplos perfeitos são o de Vangelis e Pino Donaggio. Depois de compor e gravar muitos anos com Jon Anderson (do grupo Yes), Vangelis iniciou uma colaboração longa e extremamente exitosa com o cinema, a partir de Carruagens de Fogo (com o qual ganhou seu Oscar): Blade Runner, Missing, 1492 - A Conquista do Paraíso, entre outros. Pino Donaggio, ídolo pop italiano dos anos ´60, colaborou em vários filmes de Brian de Palma (Carrie - a Estranha, Vestida para Matar, Dublê de Corpo, etc.), demonstrando um talento para o trabalho antes totalmente insuspeitado. 

Oscar 2012: P&B versus 3D

        
  "The Artist" (um filme mudo e em Preto & Branco - uma homenagem ao cinema da década de 20) e o último filme de Martin Scorsese - A Invenção de Hugo Cabret (Hugo) , sua primeira produção utilizando a mesma tecnologia 3D de Avatar, são os favoritos na corrida do Oscar deste ano, cujas indicações foram divulgadas dia 24. Hugo teve 11 indicações, mas "The Artist" , com 10, é o franco favorito, com uma avalanche de outras premiações até agora (incluindo Melhor Ator no Festival de Cannes e Globo de Ouro de Melhor Filme). O prêmio não tem mais o apelo público de décadas atrás, mas para os cinéfilos brasileiros, uma indicação, e principalmente um prêmio, garantem a distribuição de muitos filmes no Brasil. Para quem acompanha o prêmio, como eu, nota-se uma mudança no critério para escolha do principal premiado (filme). Nos últimos anos, vimos seguidamente filmes elogiados pela crítica , mas pouco vistos, ganharem o prêmio principal (Guerra ao Terror, Onde os Fracos Não tem Vez). Aqueles que todo mundo entende como "filme de Oscar" (filmes com "mensagem" - Crash - e super-produções épicas - Gladiador e Senhor dos Anéis) vem sendo preteridos em favor da aclamação crítica. Há exceções:  ano passado o "queridinho" da crítica americana A Rede Social  perdeu para O Discurso do Rei. Nos Estados Unidos são vários os prêmios concedidos pela crítica (toda grande cidade tem um, concedido pelos chamados Círculos de Críticos).


            O Oscar sempre foi muito criticado, e poucos concordam que o escolhido seja "o melhor do ano". Mas, por exemplo, este ano, dos 9 indicados a melhor filme, no mínimo 6 (além de The Artist e Hugo, Moneyball, A Árvore da Vida, Os Descendentes e Meia-Noite em Paris) figuraram nas listas dos principais jornais e revistas. O brasileiro Tropa de Elite 2 foi bem recebido pela crítica americana, mas não foi incluído nos 5 candidatos a Filme de Língua Estrangeira, cujo favorito é o iraniano A Separação. Restou pra nós , brasileiros, torcer pelos conterrâneos Sérgio Mendes e Carlinhos Brown, indicados à Melhor Canção pela animação Rio, que dirigida pelo também brasileiro Carlos Saldanha, ficou de fora da indicação em sua categoria.

INCÊNDIOS - " A Morte Nunca é o Fim de Tudo"

Só tinha 2 informações a respeito de Incêndios (Incendies, 2010), até assisti-lo. É um filme canadense, e foi indicado ao Oscar de Melhor Filme Estrangeiro. Talvez exatamente por isso o impacto foi maior, até porque com base no título, minha imaginação fez pensar em coisa bem diferente do que o filme realmente é. Exibido em poucas capitais do Brasil, acabou chegando quase junto às locadoras. O título é bastante enigmático, e não se explica totalmente pelo enredo, sendo aberto às interpretações - eu tenho a minha, mas vou guardar pra mim, para não influenciar ninguém. Nos créditos iniciais, ficamos sabendo que o filme se baseia em uma peça de teatro (do libanês Wajdi Mouawad). Difícil imaginar a história se passando em um palco. O pano de fundo do filme engloba a dura realidade do Oriente Médio - guerra, refugiados, rivalidades étnicas e religiosas - mas está mais interessado no impacto disso tudo na vida familiar das personagens principais, 2 filhos gêmeos de uma refugiada da Jordânia. Sabemos tão pouco a respeito da realidade dos países do Oriente, que pode parecer difícil compreender os fatos históricos retratados, mas esse estranhamento é o mesmo experimentado pela filha que parte em busca do passado da mãe, indo atrás dos lugares e pessoas que fizeram parte de sua história pré-exílio. Mais tarde, o irmão vai a seu encontro. Acompanhamos, então, além da busca dos irmãos, flashes da jornada empreendida pela mãe à procura de seu primeiro filho, do qual foi separada logo após o parto. Incêndios é impactante, forte, e embora se passe numa realidade praticamente desconhecida por nós, ele se beneficia da máxima "fale de sua aldeia, fale para o mundo" . Mais importante que isso, sua história e suas imagens não nos deixam quando o filme acaba. Pra mim, isso é a essência de um bom filme.

Cinema Des-Animado


2011 definitivamente não foi um bom ano para o cinema de animação. É recente a categoria de "melhor animação"  nas diversas premiações do cinema - que começou com sua inclusão no Oscar. Rango foi a escolha, praticamente unânime pelos prêmios concedidos ao cinema nos EUA,  como a melhor animação do ano passado. Já ouviu falar que a unanimidade é burra? Nesse caso, foi falta de opção mesmo. Talvez Rango tenha ganho todos os prêmios (com exceção do Globo de Ouro) por ser o único realmente bom, ao invés de o melhor. Durante 3 anos seguidos, a revista Time escolheu como o melhor filme do ano uma animação (Wall-E, Up-Altas Aventuras e Toy Story 3). Mas algo se perdeu no meio do caminho. A produção aumentou, mas a qualidade caiu. Aquele novo representado por filmes como Hércules (inovando no humor, com apelo para o público adulto) e Toy Story (animação digitalizada tão perfeita que parecia um filme 3D) já é passado. De uns 10 anos pra cá, um novo filme de animação (ao menos) é lançado a cada final de semana nos Estados Unidos, mas os grandes sucessos de bilheteria ultimamente tem ficado por conta de relançamentos como Rei Leão e A Bela e a Fera, que só comprovam que a fase de ouro da animação produziu o melhor e que não se repetirá. Vamos lembrar que até os anos 70 tínhamos somente a Disney, lançando um filme a cada ano. As bilheterias começaram a minguar depois de Mogli - o Menino Lobo. Foi somente no finalzinho dos anos 80 que a Disney se reinventou, e iniciou com A Pequena Sereia uma nova era da animação, prosseguindo com os hoje clássicos A Bela e a Fera, O Rei Leão, Aladdin e Hércules. O novo jeito de fazer animações para a garotada partiu de 2 simples premissas: 1) as crianças de hoje são muito exigentes - é preciso algo com muita qualidade  para lhes chamar a atenção e conquistar sua afeição; 2) criança não vai sozinha ao cinema - vai com pais, irmãos mais velhos, tios, avós - e esses precisam também ser conquistados. As animações passaram, então, a incluir humor e referências somente inteligíveis por um público adulto, que ia ao cinema por obrigação de acompanhar seu pimpolho, e se surpreendia gostando do que via e se divertindo até mais do que com seus filmes de "adultos". Paralelamente à Disney, vimos surgir a Pixar (que hoje pertence à Disney), inovando na técnica, com o seu primeiro sucesso Toy Story, seguido de Monstros S/A, Procurando Nemo, Os Incríveis, etc (quem não conhece algum ou todos eles?). O sucesso foi tanto que renomados diretores de filmes passaram a se aventurar na área, produzindo e experimentando na animação (não somente no tradicional "desenho animado", mas com outras técnicas - stop motion, por exemplo, aqueles filmes feitos com bonecos de massa ou outro material, e fotografados quadro-a-quadro). É o caso de Tim Burton (Batman, Alice), por exemplo, que dirigiu Noiva Cadáver e O Estranho Mundo de Jack. Na última fase desse boom da animação, ela chegou ao assim chamado cinema-de-arte, produções independentes para um público adulto e mais exigente - como é o caso do francês Persépolis e do israelense Valsa com Bashir. Demorou, mas até Spielberg, após atuar na produção de algumas delas, resolveu dirigir sua primeira animação, As Aventuras de Tintin. Nem ele deu sorte em 2011. As críticas não foram muito entusiasmadas e a bilheteria apenas razoável para o outrora "rei de Hollywood".